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Padre Ângelo Gioielli foi páraco no Bom Retiro por décadas. Por Antero Grecco

Padre Ângelo Gioielli foi pároco no Bom Retiro por décadas; fui batizado por ele. Era o estereótipo do cura tradicional: imponente, barriga avantajada, vozeirão, sempre de batina preta. Não rejeitava convite para almoço, jantar ou festa. Nem recusava um copo de vinho. Ou seja, não era bobo de perder boca-livre.

Morava com a irmã numa casa geminada na Rua Sólon, mais conhecida pelos moradores do bairro por Rua Solão. De lá para a igreja de Santo Eduardo, seu local de ofício, eram 200 metros, se tanto. Coisa de três minutos a pé, descansado.

Demorava mais porque, no breve trajeto, parava a cada dez passos para um alô aqui, um como vai ali, faz tempo que não te vejo na igreja acolá, reserva fruta boa para o padre e não só para as moças bonitas.

Certo domingo à tarde, teve missa extra, antes da tradicional, a das 18 horas. Ao chegar à sacristia, o zeloso sacristão alertou que os coroinhas habituais não tinham sido avisados da função. Não apareceu nenhum. Ou seja, o chefe deveria se virar sozinho.

O padre não quis saber de conversa fiada: mandou o auxiliar de hóstia, andores e velas chamar o Vicentinho, garoto esperto e seu vizinho. “É pra vir já!”, ordenou. “Sem enrolação.”

Menos de cinco minutos mais tarde, lá estava o Vitché, como os amigos e parentes o chamavam. “Seu padre, eu vim, mas não sou coroinha”, foi logo abrindo o jogo. “Não sei nem pôr batina nem quando tocar o sininho.” “Menino, não se preocupe: quando eu fizer sinal com a mão, você badala. Confia. Vamos logo.”

Vitché viu que não tinha como se livrar do abacaxi e encarou a missão da missa. Só achou que o padre Ângelo estava mais agitado do que o normal. Feito o nome-do-pai, lá foi a dupla para o altar central. Época ainda de missa em Latim.

O Vitché atento ao padre, até que veio o primeiro sinal e… blém, blém, blém! Sininho tocando, Ufa! Dominus vobiscum vem, Et com espiritu vai, novo gesto do padre e o Vitché, empolgado, capricha na sineta. Segunda vez. Ele sabia que tinha no máximo mais uma. E veio, uns dez minutos adiante. E o padre com uma pressa…

Depois, distraído, relaxou. Até que notou que o padre Ângelo fazia gestos nervosos. Pensou que havia perdido uma badalada, pegou o sino. Antes de soar, se apavorou, porque o cura continuava com gesto diferente. “Que foi, seu padre?”, sussurrou, já apavorado. “Pô, Vitché, 1 a 0 pro Parmera!”

O filho da mãe do padre estava com um radinho Speaker por baixo dos paramentos e da batina, fone no ouvido e ligado em jogo do Palmeiras! Enquanto relembrava a ressurreição e consagração de Jesus, torcia pela glória de Djalma Santos, Julinho e Ademir da Guia. Daí tanta rapidez em liquidar a missa.

O padre saiu com um sorriso deste tamanho, porque o Parmera tinha ganhado. O resultado ninguém lembra. Mas esse é detalhe sem importância. O que valia era o coração verde do padre Ângelo.

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