François de La Rochefoucauld (1613-1680), escritor francês, numa visão pessimista, disse que com o amor acontece o mesmo que com as aparições dos espíritos.
Ou seja, todos falam nele, mas muito poucos o viram.
O grande Amor é raríssimo!
O amor é a relação sentimental que une dois seres. Porém, esse sentido geral que atribuímos à palavra amor não é exatamente o mesmo que lhe deram os filósofos.
O amor filosófico não se limita à atuação recíproca que podem experimentar dois seres humanos.
Ou seja, trata-se do amor entendido como compreensão, intuição, simpatia para com os seres e as coisas.
Para Platão (427-347 a.C.), filósofo grego, o amor não é necessariamente sinônimo de castidade.
Platão via no amor uma sublimação do ser, uma busca do absoluto, uma procura do ideal.
Para Blaise Pascal (1623-1662), filósofo francês, o amor é uma força superior à razão, acima dos sentidos e do entendimento; é o amor entendido enquanto intuição, enquanto compreensão do mundo e do outro.
Existem diferentes formas que o amor pode ter.
Por exemplo, o amor que consiste em se apropriar do eu de outro, em agarrá-lo, em tomá-lo e em só considerar, egoisticamente, o nosso desejo, nosso exclusivo prazer, sem ter minimamente em conta os desejos, os gostos e os interesses do outro.
Lamentavelmente, esse tipo de amor é de longe o mais frequente e explica um grande número de divórcios e de rompimentos entre amantes.
Há também o amor que é subordinado ao ser de outro. Essa relação amorosa, essa fusão afetiva, faz o indivíduo perder a sua própria personalidade, seu eu profundo.
Nesse amor há um sacrifício ao prazer físico de outro, à sua felicidade moral, à satisfação dos seus desejos.
Nem só a sexualidade pode justificar esse tipo de relacionamento.
É um amor de sacrifício e renúncia de nossas próprias ideias, religião, país, vocação ou nossa arte.
É interessante ressaltar que o pensador, o místico, o patriota, o investigador científico, o poeta ou pintor podem sentir esse tipo de amor que os levará a sacrificar tudo por amor à humanidade, à pátria ou a Deus.
Existe outra forma de amor que é a mais perfeita e a mais pura.
Ou seja, trata-se de uma experiência única que poucos seres humanos poderão realizar, seria um amor quase místico que o instante é eternizado por um alheamento total das condições materiais ou vulgares da existência terrestre.
A célebre frase de Saint-Exupéry (1900-1944), escritor francês, traduz bem essa forma de amor: “Amar não é olhar um para o outro, mas olhar conjuntamente na mesma direção.”.
Seria como um amor à primeira vista recíproco!
Na realidade, a maioria das paixões amorosas traduz-se por um amor possessivo, egoísta, o homem dominando o relacionamento, pois vivemos ainda numa sociedade predominantemente “falocrática”, machista, ou a mulher dominando.
A emoção amorosa é o amor à primeira vista, é o ponto de partida do amor louco, é o momento que o apaixonado vai se sentir completamente seduzido, dominado, isto é, alienado pela sua paixão.
Na verdade, a “paixão louca” é uma verdadeira doença da alma, não há nada que se possa fazer para estancar essa cheia.
Então, devemos tolerar que o apaixonado possa fazer tudo por amor?
Nesse caso, não podemos ser senhores das nossas paixões.
Evidentemente, o amor também pode ser morno e as pessoas apaixonadas podem não ficar malucas.
Porém, para que o amor levante problemas filosóficos é necessário que atinja certa dimensão.
A paixão é provavelmente a mais intensa excitação que se pode sentir na vida!
O exemplo de Otelo, o herói shakespereano, traduz bem essa questão. Se vivesse um amor perfeito com Desdêmona e se fosse correspondido, a tragédia não existiria.
São Tomás de Aquino (1225-1274), pensador medieval e frade católico italiano, disse: “As paixões em si mesmas não são boas nem más.”.
Nós é que as tornamos boas ou más, canalizando-as para o amor da ciência, da verdade, da humanidade, ou deixando-nos arrastar pelo nosso egoísmo, pelo fardo humano ou pela nossa futilidade.
O apaixonado é um megalômano que se torna paranoico.
Ou seja, para ele, nada mais conta para além da sua paixão.
O apaixonado delira sem controlar qualquer juízo lógico, isto é, a razão nunca é motivo de paixão.
O psicanalista Daniel Lagache dizia: “Onde existe opção racional, pode afirmar-se que não há amor.”.
De fato, o casamento de conveniência, por definição, não existe paixão. Mas, na paixão louca também não existe razão.
É possível escapar da paixão se for invadido por ela?
Há pessoas que são frias, insensíveis, que mantêm a distância em relação aos acontecimentos, às emoções sentimentais ou à paixão.
Ou seja, para eles não há problema, conseguirão sempre parar o tempo.
Eles se sentem senhores das suas paixões!
Os verdadeiros apaixonados nunca são razoáveis, sensatos ou frios. São exaltados, sobre-excitados, ardentes e exuberantes.
Se pudermos canalizar o ímpeto da paixão para utilizá-la na vida cotidiana, na nossa profissão, na criação artística ou literária, nas relações entre os homens, entre as nações, entre os povos; se pudermos transformar o amor pelo indivíduo num grande Amor pela humanidade, pela verdade; se conseguirmos transformar a paixão pela pessoa numa grande paixão universal, então, nessa situação, nós teremos dominado as nossas paixões e as nossas vidas adquirem um sentido pleno.
O grande filósofo Friedrich Hegel (1770-1831), filósofo alemão, disse: “Nada de grande se fez neste mundo sem verdadeira paixão.”.
Em suma, a paixão pode nos direcionar para o amor verdadeiro e desta forma, poderemos nos tornar melhores seres humanos em prol de um mundo mais humanizado.
“O amor tudo vence, e cedamos nós ao amor.” Virgílio, poeta romano. (70 a.C. – 19 a.C.)