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Além do arco-íris: Artistas com tetracromatismo e a visão que transforma a arte – por Rafael Murió

Imagine enxergar milhões de cores que a maioria das pessoas jamais verá. Tons escondidos entre o verde e o azul, nuances sutis que escapam à percepção comum. Essa é a realidade de pessoas com tetracromatismo — uma condição rara que permite ver até 100 milhões de cores, em comparação aos cerca de 1 milhão que a maioria enxerga. E quando essa habilidade se encontra com o talento artístico, o resultado é uma explosão de criatividade que redefine os limites da arte visual.

Nesta matéria, mergulhamos no universo de artistas com tetracromatismo, explorando como essa condição influencia suas obras, suas técnicas e a forma como percebem o mundo. Prepare-se para conhecer criadores que literalmente veem além do arco-íris.

🌈 O que é o tetracromatismo?

O tetracromatismo é uma condição genética que ocorre principalmente em mulheres. Enquanto a maioria das pessoas possui três tipos de cones (células sensíveis à luz na retina) — responsáveis pela percepção do vermelho, verde e azul — os tetracromatas têm quatro. Esse quarto cone permite distinguir variações de cor que passam despercebidas para os demais.

Estudos indicam que até 12% das mulheres podem ter o gene para tetracromatismo, mas apenas uma pequena fração realmente manifesta a habilidade. E entre essas poucas, algumas se tornaram artistas visuais, transformando sua percepção única em obras que desafiam os limites da cor.

Artistas que enxergam o invisível

  1. Concetta Antico – A pioneira da arte tetracromática

Concetta Antico é talvez o nome mais conhecido quando se fala em arte e tetracromatismo. Pintora australiana radicada nos Estados Unidos, ela descobriu sua condição após testes genéticos e oftalmológicos. Suas obras são marcadas por paletas vibrantes e complexas, com detalhes cromáticos que parecem saltar da tela.

“Vejo cores em sombras, em reflexos, em lugares onde outros só veem cinza”, diz Antico.

Seus quadros impressionistas retratam paisagens, flores e cenas urbanas com uma riqueza de matizes que desafia a lógica visual comum. Ela também se dedica a divulgar o tetracromatismo, oferecendo workshops e palestras sobre como a percepção de cor pode ser expandida.

  1. Zoe Boyer – A abstração da cor

A artista britânica Zoe Boyer não sabia que era tetracromata até começar a pintar e perceber que suas escolhas de cor causavam estranhamento em outros artistas. Suas obras abstratas exploram contrastes sutis e sobreposições de tons que criam profundidade e movimento.

Boyer afirma que o tetracromatismo lhe dá uma “intuição cromática”, permitindo que ela escolha cores com precisão emocional. Suas pinturas são frequentemente descritas como “vivas” e “hipnóticas”, mesmo quando compostas por tons suaves.

  1. Ruth Hamilton – A cientista-artista

Ruth Hamilton é uma neurocientista e artista que estuda a percepção de cor e também pinta. Ela descobriu seu tetracromatismo durante pesquisas sobre visão e decidiu explorar essa habilidade em suas obras. Seus quadros misturam arte e ciência, com representações visuais de espectros de luz e mapas cromáticos.

Hamilton acredita que o tetracromatismo pode ser treinado e estimulado, e defende que a arte é uma das melhores formas de explorar essa capacidade. Suas obras são utilizadas em exposições científicas e galerias de arte contemporânea.

Como o tetracromatismo influencia a criação artística?

Para artistas tetracromatas, a cor não é apenas um elemento estético — é uma linguagem sensorial. Eles descrevem a experiência de pintar como uma tradução de sensações visuais complexas. A escolha de pigmentos, a mistura de tintas e a composição cromática são guiadas por uma percepção que vai além da técnica.

Além disso, muitos relatam que o tetracromatismo afeta sua sensibilidade emocional. Cores podem evocar sentimentos intensos, e a arte se torna uma forma de expressar essa profundidade.

O desafio de compartilhar o invisível

Apesar de enxergarem mais cores, artistas tetracromatas enfrentam um dilema: como transmitir ao público algo que ele não pode ver? Muitos usam sobreposições, texturas e contrastes para sugerir a complexidade cromática. Outros apostam na iluminação e na interação com o espaço para criar experiências imersivas.

Concetta Antico, por exemplo, utiliza técnicas impressionistas para capturar a luz e a cor como ela as vê. Zoe Boyer trabalha com camadas translúcidas que mudam conforme o ângulo de visão. Ruth Hamilton incorpora elementos científicos para educar o público sobre a percepção visual.

O futuro da arte tetracromática

Com o avanço da tecnologia, novas possibilidades se abrem para artistas tetracromatas. Realidade aumentada, projeções digitais e pigmentos inteligentes podem permitir que o público experimente parte da riqueza visual que esses artistas percebem.

Além disso, o interesse crescente pelo tetracromatismo tem levado à criação de exposições temáticas, documentários e estudos acadêmicos. A arte tetracromática está deixando de ser uma curiosidade para se tornar um campo de inovação estética.

A beleza que ultrapassa os limites

Artistas com tetracromatismo nos lembram que a realidade é muito mais rica do que aquilo que conseguimos ver. Suas obras desafiam nossos olhos e nossa imaginação, revelando que a cor é uma dimensão profunda da experiência humana.

Ao explorar o invisível, eles expandem os limites da arte e nos convidam a enxergar — ou ao menos sentir — o mundo com mais intensidade. Porque, no fim das contas, a beleza está nos olhos de quem vê. E alguns olhos veem muito mais do que outros.

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